A mais bela das poesias contemporâneas

No nosso acervo literário nacional, não há nada mais brasileiro e
encantador do que as palavras do poeta Manoel de Barros. Exalando delicadeza e
intimidade com as letras, Maneca, em suas criações, dá provas da sua
generosidade com a natureza, sempre enaltecendo sua grandeza. Vivendo das mais
importantes e relevantes desimportâncias de que se possa ter conhecimento.
Amando as singularidades como o centro do mundo. Um mundo, talvez, sem centro
real. Uma tentativa de organização do que não se correlaciona.
É de se debruçar sobre suas
obras, com destaque ao célebre “Livro das Ignorãças”, e sugar dele tudo de que
se precisa para a serenidade. É uma terapia ocupacional das desleituras,
possibilitada apenas pela imersão nas sutilezas. Pela abertura ao eterno e ao
fugaz. À delicadeza áspera e macia da realidade que não circunda, mas que é
presumida por todos nós. Pelas palavras do mestre:
“No descomeço era o
verbo
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá onde a criança diz: Eu escuto a
cor do passarinho.
[...] Em poesia que é voz de poeta, que é a voz de fazer nascimentos -
O verbo tem que pegar delírio”.
Ao nosso prodigioso poeta, autor de tantas desvalias valiosas. Executor
de tantas inutilidades indispensáveis. Ao criador de tantos caminhos
“impercorríveis”, dedico a minha Trilha de descaminhos.
Trilha de descaminhos

Embora a soberania do encontro seja o dilúvio das esperas, o gotejar das
latências que se insinuam para o encontro é o par mais extasiante. As pedras
que reverberam na obscuridade da perdição, trilhando em descompasso nas sombras
de passos tropeços.
Eis a necessidade de caminhar contra o tráfego, fazendo-se prejudicial à
normalidade. Colocando fogo na incredulidade da desesxistência. Na pacificidade
das normas enraizadas. O título de inventor não é uma questão social, pois.
Quando se olha para o lado com as mãos, sentindo a carícia de quem
contrapõe-se ao fluxo, a fluidez das horas é apenas um pretexto de conversa.
Uma andorinha distraída dos ocasos sinestésicos ou sinestesiais. Mesmo que não
exista, prefiro o segundo. O que não existe é sempre mais excitante.
Assim, na fugacidade de um eterno porvir, a trilha vai esvaindo em
cinzas obstinadas ao desmarque. Sendo, pois, uma sentença de perder-se. Um mapa
de desorientação, levando os pássaros a guiarem, a mar aberto, o mais vil dos
terrenos. O mais são dos apadrinhados pela terra: o início dos tempos. O fim
dos recomeços.
Como um marca-páginas que se confunde com aquilo que procura discernir,
o trajeto escalado para uma vida não passa de um roteiro de areia. Uma ilusão
dos seres mais desimportantes para os soberanos da habitação, sem tempo para
nada, desejando o tudo para o seu tempo.
Parece-me claro que a estrada é uma anedota de uma tartaruga que se
finge de lenta para acompanhar cada volta dada pelo sapiens no mesmo lugar.
Cada passo para frente é uma demarcação oblíqua. O teatro do planeta é
protagonizado pelos pensamentos. A plateia é a própria produção. Somos senão o
divertimento das espécies. A piada de uma soberba adjacente da miséria.
Debaixo dos escombros das imperfeições, há uma singularidade enérgica
capaz de apaziguar qualquer alarde. O nascimento das desimportâncias em
congruência com o barulho dos desnorteados de cima. São as canções de ninar. A
garantia da paz corpórea. Basta a distração da superioridade.
Viver sob o pretexto da
reclusão. A supremacia de se fazer ínfimo, percorrendo pelos despropósitos para
se chegar a lugar algum. Ciente do destino incerto. Propenso e empolgado pela
incolumidade que desvirgina as unções predestinadas. Penitência de vida,
servindo de passatempo a quem realmente interessa: criação inerente à falta do
que fazer.
Thiane Ávila.
Thiane Ávila.
1 comentários
Oiee
ResponderExcluirNão conhecia esse autor, e de cara adorei conhecer um pouquinho mais!
Abraços :)
www.chamandoumleitor.blogspot.com.br